O mercado imobiliário está mais digital e sustentável do que nunca, tem novos perfis de investidores e todos os dias vê nascer diferentes conceitos e tendências habitacionais, como o Build-to-Rent e o Co-Living. Daniel Almeida e Bárbara Ribeiro, o CEO e a Diretora Comercial da Dahouse, falaram à Spot dos desafios e soluções do ‘admirável mundo novo do imobiliário’…
Quais são, no vosso entender, os principais gatilhos do tão falado ‘problema da habitação’?
A escassez de oferta de habitação e o aumento exponencial da procura fizeram com que os preços tenham subido estratosfericamente. A vinda de muitos estrangeiros para Portugal, a inflação, o aumento do desemprego, e consequentemente a diminuição do poder de compra das famílias, assim como o aumento dos custos da construção, nomeadamente devido à burocracia e aos impostos, contribuíram para o atual panorama
Quais as possíveis soluções para este problema?
A realidade é que muitas pessoas enfrentam dificuldades em aceder a uma habitação adequada a preços acessíveis. Mais do que nunca é necessário um esforço conjunto de políticas públicas eficazes e abrangentes que possam garantir esse acesso à habitação para todos.
Se o Estado não intervir, o mercado vai demorar muito tempo a ajustar-se por si só, e poderemos passar por uma recessão económica, o que é de evitar. Sendo assim, só com medidas governamentais é que se pode regular esse problema.
“Algumas das soluções, poderiam passar por reduzir a carga fiscal na habitação, acabar com IMT e imposto selo, reduzir o IRS das segundas habitações e criar incentivos à Habitação jovem, nomeadamente na entrada inicial de 20%.” Daniel Almeida
Como contrariar a especulação imobiliária?
A especulação imobiliária é algo que fará sempre parte deste mercado, tem é de ser controlada e devidamente fiscalizada. O facto de se vender um imóvel, em curto espaço de tempo, acima de preço a que se comprou não significa que houve especulação, tudo tem que ver com as necessidades do momento de cada cliente assim como do bom trabalho das mediadoras. O problema reside em aproveitamentos que existem e esses é que têm de ser combatidos e regulados, aqui sim com aumento de impostos, mas com fiscalização apertada.
O investimento estrangeiro, os vistos gold e os fundos de investimento desequilibraram a balança?
Claramente, os vistos gold serviram para atrair investidores, mas atraíram simultaneamente negócios duvidosos promovendo uma especulação desmedida e proveitosa para vários intermediários, distorcendo o mercado imobiliário, criando corrupção e lavagem de dinheiro. Não é por acaso que já foi retirado em todos os países, sendo que em Portugal estará para breve. O investimento estrangeiro é importante desde que seja para primeira habitação, de forma a poder ser controlado e equilibrado para a economia dos residentes.
Que opinião têm do pacote ‘Mais habitação’?
O pacote ‘Mais habitação’ é um conjunto de medidas que foram apresentadas pelo governo português com o objetivo de combater o problema da habitação em Portugal. O pacote inclui várias medidas para aumentar a oferta de habitação, incentivar a reabilitação urbana e proteger os inquilinos.
O mais importante desse pacote é o facto de se ter começado a discutir esse tema na Assembleia, as medidas ainda não foram implementadas, por isso é difícil um julgamento. Entendemos que algumas poderão ser polémicas ou mais radicais, mas essas medidas radicais serão necessárias. Na nossa opinião não mexeram na parte mais importante, que tem a ver com a carga fiscal, e independentemente dessas medidas o mais importante é a aplicação das mesmas assim como a sua fiscalização.
“A profissionalização potencia o cumprimento das normas e regulamentações legais e a promoção da ética e da integridade no mercado imobiliário.” Daniel Almeida
Alojamento Local, arrendamento coercivo ou tetos de renda têm efeitos controversos?
O Alojamento Local (AL), o arrendamento coercivo e os tetos de renda têm sido temas bastante debatidos em Portugal, especialmente no que diz respeito ao impacto que podem ter no mercado de habitação.
O Alojamento Local, por exemplo, tem sido acusado de contribuir para a gentrificação de algumas áreas urbanas em Portugal, levando ao aumento dos preços das habitações e à expulsão de residentes locais de longa data. No entanto, o AL também pode ter benefícios, como a criação de empregos e o aumento da oferta de alojamento turístico, que pode impulsionar a economia local.
O arrendamento coercivo, por sua vez, tem sido apontado como uma medida necessária para proteger os inquilinos de proprietários que os expulsam sem justa causa ou que não renovam contratos de arrendamento. No entanto, essa medida pode levar a uma diminuição da oferta de alojamento disponível, especialmente para aqueles que têm intenção de arrendar a longo prazo, uma vez que pode dissuadir os proprietários de arrendarem as suas propriedades.
Os tetos de renda também são uma medida controversa, já que podem limitar a renda que os proprietários podem cobrar pelos seus imóveis, tornando menos atraente para eles arrendarem as suas propriedades. Por outro lado, os tetos de renda podem ajudar a proteger os inquilinos de aumentos abusivos de renda e garantir que a habitação permaneça acessível para todos, especialmente em áreas urbanas onde os preços das habitações podem ser elevados.
Em geral, o efeito pernicioso ou positivo desses fatores no mercado de habitação em Portugal depende da perspetiva e das circunstâncias específicas de cada situação. Por isso, é importante adotar políticas e medidas que equilibrem as necessidades dos proprietários e dos inquilinos, de forma a garantir que todos possam ter acesso a habitação adequada e a preços justos.
O que vem mudar com a simplificação dos licenciamentos?
Acreditamos que se possa escriturar imóveis mais rapidamente, mas isso em si é uma falsa questão, pelo menos em Braga. É verdade que é um processo demasiado burocrático e lento e que deve ser mais rápido e mais simples, mas ao mesmo tempo não se pode facilitar e as construções têm de ser fiscalizadas ao abrigo de um verdadeiro conceito de urbanismo.
Alguns críticos alertam que a simplificação dos licenciamentos pode levar a um abrandamento na qualidade da construção, uma vez que as obras de menor dimensão não estão sujeitas à mesma fiscalização rigorosa que as grandes obras. Por isso, é importante que a simplificação dos licenciamentos seja implementada de forma equilibrada, garantindo que a qualidade e a segurança das habitações não sejam comprometidas.
O município de Braga abriu, recentemente, um concurso para o arrendamento de 50 casas a preços acessíveis, destinado à classe média. A classe média sofre hoje problemas na habitação que não sofria há anos?
Os preços elevados do mercado imobiliário têm dificultado o acesso a habitação adequada para muitas pessoas, incluindo a classe média, que tradicionalmente não enfrentava grandes dificuldades neste campo.
O aumento dos preços de arrendamento e compra de casa, têm contribuído para a exclusão social de muitas famílias de classe média, que se veem forçadas a viver em condições degradadas, a recorrer a empréstimos bancários excessivos ou a deslocarem-se para as periferias das cidades em busca de habitação mais barata.
Com os rendimentos médios não é possível pagar os valores de renda ou prestação que se estão a praticar
O que pensam de conceitos com uma popularidade crescente em todo o mundo, como o Build to Rent?
O conceito de Build to Rent (construir para arrendar) é uma tendência crescente em todo o mundo, e que tem ganho popularidade em Portugal nos últimos anos. Este conceito consiste na construção de edifícios residenciais especificamente destinados ao arrendamento, com o objetivo de criar um mercado de arrendamento mais dinâmico e com preços mais acessíveis.
A construção de habitações destinadas ao arrendamento tem várias vantagens, tais como a criação de uma oferta de habitação mais estável e previsível, a promoção da competitividade no mercado de arrendamento, e a possibilidade de promover a reabilitação urbana e a regeneração de áreas urbanas degradadas.
Além disso, o Build to Rent pode ainda ajudar a atrair investimento para o setor imobiliário, contribuindo para o desenvolvimento económico do país e a criação de emprego.
Estarão todos os mediadores preparados para estes desafios?
A adaptação aos desafios trazidos pelo mercado imobiliário é um processo constante, que exige dos mediadores imobiliários uma capacidade de atualização e de inovação contínuas.
A qualidade dos serviços prestados pelos mediadores pode variar significativamente, dependendo da sua formação e experiência, da sua capacidade de adaptação às mudanças do mercado e da sua ética profissional.
É fundamental que os mediadores imobiliários estejam sempre atualizados quanto às tendências do mercado, às tecnologias disponíveis, às mudanças regulatórias e às necessidades dos clientes. A formação contínua e a busca pela melhoria da qualidade dos serviços prestados são essenciais para garantir a competitividade e a eficácia dos mediadores imobiliários em Portugal, e para que estes possam enfrentar com sucesso os desafios que se colocam no mercado imobiliário.
Hoje o conhecimento do mediador imobiliário deve ser cada vez mais heterogéneo?
Sim, mas sempre com uma vertente humana e com preocupações humanas, a confiança é um fator decisivo. Mas o mundo está a evoluir muito rapidamente e novos conceitos estão a ser implementados
Hoje em dia, os mediadores imobiliários têm de estar familiarizados com as novas tecnologias, como os softwares de gestão imobiliária, as ferramentas de marketing digital e as plataformas de venda e arrendamento online. Além disso, devem ter conhecimentos de marketing, gestão de projetos, finanças, e legislação, entre outras áreas.
Os mediadores imobiliários devem ter um conhecimento heterogéneo e atualizado sobre as tendências e tecnologias do mercado, de modo a poderem enfrentar com sucesso os desafios e aproveitar as oportunidades que surgem no setor imobiliário.
“O conceito de Build to Rent (construir para alugar) é uma tendência crescente em todo o mundo, e que tem ganho popularidade em Portugal nos últimos anos” Bárbara Ribeiro
O mercado imobiliário está a mudar?
Os consumidores estão mais exigentes e procuram soluções personalizadas e adaptadas às suas necessidades e preferências. Por isso, as empresas imobiliárias têm vindo a adotar uma abordagem mais ‘tailor-made’, ou seja, personalizada e adaptada às necessidades de cada cliente.
Além disso, a especialização tem-se tornado cada vez mais importante. Os profissionais do setor imobiliário estão a especializar-se em áreas específicas, como o mercado de luxo, o mercado residencial, o mercado de arrendamento, entre outros. A especialização leva a que os profissionais adquiram um conhecimento mais aprofundado e específico do mercado em que atuam, permitindo-lhes com isso oferecer um serviço mais completo e de maior qualidade aos seus clientes.
É também, por isso, tão importante a profissionalização do setor?
Já não é de agora, não se consegue compreender como este setor ainda não esta profissionalizado.
A profissionalização do setor imobiliário é fundamental para garantir um serviço de qualidade aos clientes e para promover a transparência e a ética no mercado.
Um mercado imobiliário profissionalizado implica a existência de profissionais qualificados, com formação técnica e conhecimento especializado, capazes de prestarem um serviço de qualidade e de aconselharem de forma objetiva e transparente os seus clientes. A profissionalização potencia o cumprimento das normas e regulamentações legais e a promoção da ética e da integridade no mercado imobiliário.
“A procura por casas sustentáveis e energeticamente eficientes está em crescimento, e é esperado que esta tendência continue a crescer no futuro.” Bárbara Ribeiro
É necessário acompanhar as novas necessidades habitacionais e os desafios do futuro da habitação em Braga?
Acredito que sim, mas terá de passar pela profissionalização e pela educação cultural das pessoas.
O setor imobiliário está a evoluir rapidamente e a adaptar-se às novas necessidades habitacionais e aos desafios do futuro da habitação. Isso implica a emergência de um novo ecossistema de mediação imobiliária, que seja capaz de responder às novas tendências e desafios do mercado.
Para isso, é necessário preencher a lacuna geracional que existe atualmente no setor imobiliário, através da formação e capacitação de novos profissionais que estejam preparados para lidar com as novas tecnologias, os novos perfis de investidores e os novos conceitos de habitação.
Quais serão as grandes tendências e desafios imobiliários?
A tecnologia está a mudar a forma como os negócios imobiliários são realizados, da pesquisa de casas à realização de transações. O uso de tecnologia como realidade virtual e inteligência artificial, por exemplo, podem melhorar a eficiência e transparência do setor imobiliário.
A procura por casas sustentáveis e energeticamente eficientes está em crescimento, e é esperado que esta tendência continue a crescer no futuro. Isso significa que as casas devem ser construídas de forma mais sustentável e utilizar tecnologias mais avançadas para reduzir o impacto ambiental.
É essencial pensar num conceito de urbanismo, à imagem do que é feito nas principais cidades europeias, sem olhar a interesses. Aumentar a qualidade de construção. Pensar em habitações assim como espaços públicos orientados para a população e para o bom uso que ela faz dos mesmos. Ter a preocupação de construir para pessoas de mobilidade reduzida.
As novas formas de habitação, como o Build-to-Rent e o Co-Living, estão a ganhar popularidade e são uma tendência crescente em Portugal. Essas opções de habitação oferecem mais flexibilidade e opções para os consumidores.
A demografia em Portugal está a mudar, com o envelhecimento da população e o aumento da diversidade cultural. Isso tem impacto no tipo de habitação procurada e nas necessidades de serviços e infraestruturas.